Era uma vez um homem e uma mulher
que tinham cinco filhas. As quatro filhas mais velhas eram excepcionalmente belas,
porém a caçula era comparativamente estranha, com ossos e feições grandes e longe de ser perfeita.
Por conta disso, era perturbada pelas irmãs, e mesmo os pais faziam pouco para esconder sua
reprovação, lamentando sua má sorte em ter tal criança e pensando se algum dia ela se transformaria. Eles todos
criticavam incessantemente a pobre garota, dizendo coisas como:
- Quem sabe, se você comesse menos,
seria menor.
Apesar de ela não comer mais que as outras, ou...
- Se você passar limão nos cabelos
eles não serão dessa cor tão apagada.
Na verdade, a garota desafortunada ia para a cama
muitas vezes faminta e passava limão nos cabelos, mas nada do que fazia parecia fazer diferença.
Eles sempre achavam alguma coisa de errado com ela.
O povo da cidade não era
diferente de sua família. Eles insultavam e criticavam a irmã mais nova e insossa e outras garotas
como ela. Por ser comparada às irmãs mais velhas bem mais bonitas, a mais nova se tornou conhecida de
todos como "a patinha feia".
Conforme as garotas cresciam, as
quatro filhas mais velhas ficavam cada vez mais bonitas. E, ao ficarem mais belas, elas também
se tornavam mais arrogantes e insensíveis. Mas, a cada dia a patinha feia era mais gentil e generosa
e, apesar dos maus tratos constantes, cada uma das irmãs preferia a sua companhia em lugar da companhia
de qualquer uma das outras.
Logo as meninas se tornaram
mulheres. Agora, a mais velha de todas era uma mulher arrebatadora e pensava consigo
mesma:
- Por que eu devo continuar a
estudar quando posso ganhar uma vida melhor simplesmente deixando que os homens olhem para
a minha beleza?
Pois, de fato, naquela época, as mulheres podiam ganhar quantias
significativas de dinheiro para exibir sua beleza aberta e explicitamente aos homens que valorizavam a mulher
segundo essa qualidade. E a filha mais velha ganhou o mundo com apenas esse atributo para fazer a
sua fortuna.
A segunda irmã mais velha também
era muito bonita, e pensou para si mesma:
- Por que tenho de fazer qualquer
coisa que seja, se os homens me acham tão atraente e estão sempre dispostos a fazer tudo por
mim?
E se lançou ao mundo com o ponto de vista de fazer sua fortuna à vista da generosidade
de seus muitos admiradores.
A terceira irmã mais velha nunca
teve a chance de formular um plano de qualquer natureza, pois o destino interveio e ela estava
casada com um jovem, de quem estava grávida. A quarta irmã pensou:
-Oh, o que significam os homens
para mim, se sou mais bela do que todas as minhas irmãs mais velhas juntas?
E ela resolveu
fazer uma fortuna maior do que as outras, sem ter de se submeter aos homens como elas o faziam. Com
muita confiança em sua beleza, ela saiu em busca da realização disponível para as mulheres belas
de sua época, que era ser modelo profissional de moda e beleza.
E a irmã mais nova, que era a
patinha feia, não tinha ilusões de trilhar seu caminho no mundo
por meio de sua aparência,
portanto ela percebeu que estaria mais bem servida se continuasse a estudar. Ela encontrou uma
pequena universidade rural, longe dos preconceitos de sua cidade natal. Sem contar nada a ninguém,
conseguiu uma casinha próxima ao campus da universidade e começou sua nova vida.
A patinha feia logo se adaptou à
vida acadêmica. Ela gostava imensamente de seus estudos e se fortaleceu por seu crescente
conhecimento de si própria e do mundo ao seu redor. As pessoas que ela escolheu para se relacionar não
pareciam notar tanto que ela não era bonita, pois valorizavam as muitas outras qualidades que ela
possuía. Sem os constantes lembretes da sua carência de beleza perfeita, ela lentamente começou
a ganhar autoconfiança. Era repetidamente surpreendida pelas pequenas manifestações de alegria
em sua vida, e estava mais feliz do que jamais imaginara ser possível.
Numa tarde de primavera, enquanto
a patinha feia descansava despreocupada à sombra de uma imensa árvore no quintal, lendo
um livro, subitamente surgiu uma sombra sobre ela. Ela olhou para cima e pôs os olhos na criatura
mais bela que já vira em toda a sua vida. Ele era bem moldado e moreno, e
sorria para ela. Ainda pensando que fosse criação de sua mente (talvez um personagem da
história romântica que ela estava lendo), a princípio ela apenas o olhou, muda. Vendo a sua
expressão de surpresa, o jovem se dirigiu a ela em tom amistoso, explicando que estava apenas
passando por ali a caminho de um lago onde iria nadar. Aparentemente, o único caminho para se chegar ao
lago escondido era atravessando o quintal da patinha feia!
A patinha feia reconheceu o belo
rapaz como um colega da mesma faculdade em que estudava. Ela sentiu secretamente que iria
gostar de vê-lo nos dias quentes de verão a caminho do lago para algumas braçadas vespertinas.
Talvez de maneira demasiadamente calorosa, ela lhe disse que ele seria muito bem vindo a atravessar o seu
quintal sempre que quisesse.
Mas o belo rapaz não a deixou
imediatamente após a sua concessão, ao contrário, ele permaneceu e perguntou sobre o
livro que ela estava lendo, sobre suas aulas na universidade e outras questões sobre ela, que nenhum
outro homem jamais havia perguntado.
Os olhos da patinha feia
brilharam de felicidade enquanto ela papeava com seu novo amigo, mas, subitamente, as imagens de
suas irmãs piscaram diante dela, que lembrou como era feia. E ela se sentiu envergonhada por qualquer
homem olhá-la, e, dando uma desculpa, fugiu bruscamente para dentro da casa, onde viu, por uma
janelinha, o jovem partir rumo ao lago. Ele era enérgico e saudável, com braços e ombros grandes, e
ela desejou, pela milésima vez, ser bonita como as irmãs.
Os dias foram ficando mais
quentes, e logo as árvores e flores haviam florescido inteiramente. O jovem agora passava pelo quintal
da patinha feia quase todos os dias a caminho do lago. E a cada vez que passava, ele parava e falava
com ela. Lentamente, ela superou o seu constrangimento em relação a ele, chegando a ansiar por suas
visitas, e os dois tiveram a chance de se conhecer melhor. Às vezes, eles passavam um pelo outro na
universidade, e ele a empolgava por chamar seu nome.
Um dia, o belo rapaz convidou a
patinha feia para acompanhá-lo ao lago. Ela declinou rudemente, mas, desse dia em
diante, sentiu uma estranha atração em direção do lago, e frequentemente se via imaginando
como era a água, e como seria brincar nela com o seu belo amigo.
E foi assim até uma manhã de
verão extraordinariamente quente, quando a patinha feia saiu da cama e foi até o lago de
camisola. Ela disse a si mesma que só queria olhar o lago, mas ele era mais bonito do que imaginara. Ela
olhou em volta com culpa. Certamente não haveria ninguém por perto a essa hora da manhã. Ela poderia
simplesmente entrar na água fresca por um tempo e depois voltar para casa. Antes que pudesse se
deter, já havia tirado a camisola e
entrado na água. A patinha feia espirrava água por
todo lado, nadando alegremente. A água parecia seda em sua pele. Quando se cansou de nadar,
ficou boiando, olhando as nuvens que cobriam o céu azul de verão.Dessa forma, ela se esqueceu
completamente da hora.
A patinha feia não notara a sua
aproximação até que ouviu um barulho na água resultante do mergulho. Ela ficou totalmente
imóvel, paralisada de terror, enquanto esperava que ele subisse à tona. Torcia muito para que ele não
estivesse de olhos abertos embaixo d'água, pois tinha vergonha que ele olhasse seu corpo. E como ela
poderia sair da água e colocar a camisola de volta? Finalmente, sua cabeça e braços
surgiram na superfície. Havia um sorriso enorme em seu belo rosto.
- Eu a tinha imaginado uma garota
naturalista, mas não achei que tivesse tanta coragem - disse ele, alegremente.
Então ele tinha aberto os olhos
embaixo da água! Ela ficou tão horrorizada e constrangida que as lágrimas vieram aos seus olhos.
Ele estava nadando lentamente em sua direção. Ela queria lhe pedir que virasse para o outro lado
para que ela pudesse sair da água, mas temia o som que faria ao tentar falar. Ele ainda sorria quando se
aproximou. Ela viu que ele estava segurando algo na mão para ela e percebeu que era o seu calção de
banho.
- Agora estamos quites -disse ele,
gargalhando.
No entanto, ela não sentiu estar
"quites" com o belo jovem, e ficou simplesmente ali, em silêncio, segurando o calção no
ar. Finalmente, ele pareceu notar seu
constrangimento. Lentamente pegou o calção de seus dedos tensos e o jogou para a margem.
Ele estava bem perto e ela imaginou que ele estaria pensando como ela era feia, e até esperou que
ele fosse soltar uma gargalha ou insulto no momento seguinte, mas, para sua profunda perplexidade, ele
lentamente baixou a cabeça e pousou os lábios nos dela. A sensação era tão gloriosa que ela quase
perdeu o equilíbrio, mas, no mesmo instante, ele a abraçou e a puxou para mais perto, para que não
houvesse perigo de ela ir a lugar algum. O corpo dele era extremamente quente. Seus lábios eram exigentes
e insistentes. Seus braços a prendiam mais forte, fazendo com que seus corpos se comprimissem
juntos. A água estava agitada ao redor deles. No tumulto de seu primeiro beijo, a patinha feia
esqueceu que era feia e retribuiu-o com toda a paixão que sentia. Ela então percebeu que estava se
apaixonando por ele, e se perguntou se ele
podia adivinhar seus sentimentos e o que achava disso. Enquanto ela pensava essas coisas, ele
afastou os lábios para olhá-la nos olhos. Ele sorriu para ela com uma expressão de incerteza,
confessando-lhe que também a amava. Depois a beijou repetidamente e sem
parar! Ela se agarrou a ele, sem querer que os beijos cessassem, mas, de repente, seus beijos
começaram a ficar mais impetuosos, e suas mãos tocavam por toda parte.
Ela descobriu que adorava a
sensação de pressionar seu corpo nu contra o dele. Sentia-se tonta de felicidade em ter suas mãos
fortes e belos lábios sobre sua pele, mas os beijos se tornavam cada vez mais aflitos e ansiosos, e o
corpo dele pressionava rigidamente contra o dela. Ela estava totalmente despreparada para o que estava
acontecendo. E o que é pior, ela não podia evitar pensar que fazia parte disso.
Com um gritinho, ela se afastou
dele. Sabia que ele gostava dela de alguma forma, mas será que realmente poderia amá-la? Ela não
se permitiria ser subjugada, sendo feia, ou não!
Boas ou más, preciso saber quais
são as suas intenções em relação a mim, pensou ela, e se eu concordo, quaisquer que sejam. Por um instante eles ficaram
separados, e, por um momento pareceu que ele estava zangado com ela. Mas ele logo sorriu.
-Eu vou virar o rosto para a
floresta enquanto você se veste -disse ele, gentilmente. -Mas você
irá me esperar? -perguntou ele.
-Sim, vou esperar por você
-prometeu ela.
-Olhem, se não é a nossa querida
irmãzinha sem sal! -gritaram as quatro, alegremente.
A mais nova das cinco sorriu ternamente
para suas irmãs.
- Desculpem por estar atrasada -disse ela. Mas que bom ver vocês todas juntas
novamente!
- Devo dizer - afirmou a mais
velha, se dirigindo à caçula. - Os anos devem ter sido bons para
você, pois jamais a vi com uma
aparência tão boa!
A patinha feia sorriu.
- Duvido que os detalhes de minha
vida possam prender sua atenção por um instante, com vidas tão excitantes como devem ter
sido as suas - respondeu.
Ela corou levemente ao dizer isso, pois estava pensando na noite anterior que
tivera com seu amado marido e estava certa de que, mesmo com toda a sua beleza, suas irmãs não
poderiam ter experimentado maior felicidade do que a dela.
- Que emocionante! - exclamou a
terceira irmã, com amargura. - Fui roubada de toda a emoção que deveria ter tido.
- Ao menos você se casou
- resmungou a outra, com ainda mais amargura.
-Casada! - respondeu ela - Encarcerada seria uma
palavra mais apropriada.
- Você não está feliz por estar casada? - perguntou a patinha feia, chocada.
- Pareço
estar feliz? - respondeu ela, com lágrimas se formando dentro de seus
belos olhos.
As quatro irmãs a encaravam surpresas.
- Oh, meu marido nunca me amou - confessou. - Quando éramos jovens ele
tinha atração por mim, mas só queria uma coisa. Confundi aquilo com afeição. Nunca parei
para pensar no que ele realmente sentia por mim. Estava tão feliz em ter atenção e tão certa de que
minha beleza o faria me amar. Mas ele não me ama! Para ele as mulheres são objetos
substituíveis. Ele tem casos, enquanto eu fico em casa e tomo conta de nossos filhos.
- Meu Deus -disse a mais
velha. - E eu achei que estivesse ruim para mim.
- Eu daria qualquer coisa para ter a sua vida! disse
a dama infeliz.
- Não, acho que não daria -disse
a mais velha.
Depois ela se voltou às irmãs com sua história triste.
- Veja, pensei em fazer
minha fortuna mostrando minha beleza abertamente aos homens, então, me tornei uma dançarina erótica.
Imaginei que pudesse ganhar a vida bem melhor assim do que através de qualquer coisa que os
estudos pudessem me ensinar. E, no começo, eu estava certa. Mas só se pode fazer isso por um tempo.
Logo há garotas mais jovens que tomam o seu lugar e você não ganha quase nada depois disso.
- Talvez - disse a outra, com o
casamento infeliz, sem enxergar a ironia. - Você deveria ter se
casado com um de seus admiradores
enquanto ainda era jovem.
- Aí eu estaria no mesmo barco que
você! respondeu a mais velha, desgostosa. - Além disso, a maioria deles já estava casada.
- Ela suspirou infeliz, antes de prosseguir. - De qualquer forma, como eu poderia confiar num homem depois
de ver o comportamento que eles têm quando não estão com as esposas?
- Isso é bem verdade -disse a
outra irmã, que fizera a vida vendendo mais de si do que a mais
velha. - Uma vez que você vê esse
lado dos homens, não pode mais voltar a confiar neles. -Ela olhou tristemente para a irmã mais
velha e acrescentou: - E quando você vende essa sua parte, ela já não lhe pertence. Isso se torna uma
ocupação tediosa. Eu nunca desfrutei, realmente, de estar com um homem, porque nunca foi sob as minhas
condições.
- Você fez com que fosse tão fácil
para os homens a tratarem assim - disse a irmã infeliz, de
forma áspera, acrescentando um
novo fôlego- e o restante de nós também.
- Ah, então é culpa nossa pelos
homens serem como são - respondeu a irmã mais velha, na
defensiva. - Porque as mulheres
são sempre tão velozes em culpar as outras mulheres?
- Talvez seja porque você está
disposta a fazer coisas por um preço, que, de outra forma, os
homens teriam se provar
merecedores - disse ela, ressentida, agora ficando zangada. - Muitas mulheres, assim como eu, continuam a
trabalhar para evoluir... e são, aliás, muito mais dos que seus homens merecem. Mas os homens não
precisam despender esforço algum, no entanto eles têm as mais belas mulheres ao seu alcance, contanto
que tenham dinheiro.
- Bem, deve deixá-la feliz o fato
de que nós pagamos um preço bem alto oferecendo-lhes esse serviço -disse a irmã mais velha.
- Sim, eu vejo que sim - disse a
irmã, lentamente. - Mas você escolheu o preço a pagar em troca dos impostos que recolheu. O
restante de nós não fez qualquer escolha do gênero nem recolheu tais impostos, no entanto, temos de
pagar o preço junto com você!
Houve um silêncio por um instante
depois desse rompante. A terceira irmã mais velha estava
acabrunhada, falando de seu casamento, enquanto a irmã mais velha fazia uma tentativa de
mudar de assunto.
- Você sabe -disse ela, com um
suspiro - é verdade sobre os homens. A maioria dos meus
clientes são gordos, carecas e
horrendos.
- Realmente - opinou a quarta irmã
mais velha, que ficara em silêncio até então. - É porque se
espera que sejamos perfeitas, num
mundo onde a perfeição não existe. O padrão é tão alto que nenhuma mulher poderia
alcançá-lo. Enquanto isso, os homens simplesmente se sentam e desfrutam do espetáculo. Eles não têm
preocupação com sua aparência, porque ninguém jamais os nota. São invisíveis.
As irmãs riram em
concordância ao ouvirem isso.
-Mas você chegou à perfeição física - interferiu a patinha feia, que
ouvira silenciosamente, em choque, a arenga confusa das irmãs. - Vi sua foto na capa daquela revista
prestigiada.
-Tenho vergonha daquela foto
- disse a irmã, com emoção, ganhando total atenção das outras, depois continuando a sua própria
história, como segue.
"Sei que
sou uma bela mulher. Dediquei minha vida inteira beleza! Mas isso não é suficiente
para satisfazer os editores das... rá!
-ela fez uma pausa antes da palavra para dar mais ênfase - revistas femininas. Como as mulheres
agüentam lê-las não compreendo. De qualquer forma, descobri que
eu não era, na realidade nenhuma de nós é, boa o bastante para as páginas daqueles
catálogos militantes de desilusão e tortura feminina. Antes que sequer fosse aceita como candidata, descobri
que teria de me submeter a inúmeras cirurgias remodeladoras e literalmente parar de comer. Fiz
tudo isso e fui escolhida para a revista que você mencionou. Porém, você acredita que, depois de tudo
o que sofri e suportei, no fim eu ainda não era bela o suficiente e a foto teve de ser retocada na
versão final?"
Havia lágrimas em seus olhos enquanto ela olhava para a irmã mais nova.
- Aquela não é uma
foto minha, mas de um fantasma; o mesmo fantasma usado para mulheres que estão na corrida
pela perfeição. - Ela olhou em volta tristemente, para suas irmãs, depois acrescentou: - é o mesmo fantasma
que arruinou as vidas de cada uma de nós.
Por alguma razão, isso levou a
irmã mais nova ao centro da atenção delas. Quase simultaneamente as mulheres se
voltaram para ela.
- Como tem sido a vida para você?
- perguntou a mais velha.
- Bem, eu certamente estou
satisfeita com ela - respondeu, humildemente, sem querer se exibir de sua própria felicidade diante do
que acabara de ouvir
- Você continuou a estudar, não
foi? - outra irmã perguntou. - O que você estudou?
Timidamente, ela começou a contar
para as irmãs sobre seus estudos, nunca poupando palavras quando falava de coisas que
aprendera. Ainda assim, o silêncio delas a intimidava, e sua voz sumia. Sem dúvida elas achariam sua vida
ridícula, mas a irmã mais velha não zombou
nem riu. Questionavam-na com interesse e ela foi contando sobre seus vários interesses e
seu casamento, sua filhinha. Sentindo-se culpada por sua sorte e felicidade, ela se omitiu em
contar sobre os tantos pequenos prazeres de sua vida; como o fato de seu marido trabalhar duro para se
manter em forma para ela, ou como ele jamais perdera o interesse em fazer amor com ela. No entanto,
as irmãs eram astutas demais para não enxergarem essas coisas em seu rosto, e não podiam evitar
invejá-la pelas realizações, apesar de seus supostos defeitos físicos
A terceira irmã, sendo a mais
amarga de todas, não podia deixar de afirmar:
- Parece que nós todas teríamos nos dado melhor se
tivéssemos nascido feias!
A mais velha imediatamente saltou em defesa da mais nova, dizendo:
- Você está com inveja.
A mais nova tomou coragem depois disso.
- Não acho que eu seja tão feliz por
ser feia disse ela, lentamente, pensando. -É claro que não recorri à beleza física para me fazer
favores, e isso foi uma parte. Mas, principalmente, senti que, independentemente do que eu
busque na vida, devo primeiro identificar o que realmente é, depois descobrir o que iria me custar. E
foi o que fiz.
Ela olhou para a irmã tão infeliz
e mal casada e prosseguiu:
- Você mesma disse que se tivesse
recuado e esperado,teria descoberto que seu marido não a amava de verdade. Mas se permitiu
ser lisonjeada por esses mimos, sem perceber que não se tratava de mimos realmente, pois ele não
se importava nem um pouco com você. Ela virou para as outras irmãs e
continuou:
- Cada uma de vocês sofreu de
forma semelhante, porque se deixaram ser usadas como objetos naquele momento. Receberam seu
pagamento, mas não foi suficiente, levando em conta que trocaram suas próprias exigências por uma
vida feliz por esse pagamento. De certa forma, vocês tornaram os
homens isentos de suas ações. Depois disso, parecia haver muito pouco a ser dito.
Finalmente de volta ao seu lar, seu céu, a patinha feia suspirou aliviada. Era tarde, mas uma luz de boas vindas
se acendeu na entrada. Havia flores frescas, recém cortadas num vaso sobre uma mesinha. Ela parou
um instante para cheirá-las, saboreando tudo no fato de estar em casa. Seguiu escada acima, até
chegar a um quartinho, no alto. Entrou, andando cuidadosamente pela escuridão, até uma pequena cama
onde mal se ouvia o som do sono emitido dos cobertores macios. Ela parou para beijar o rostinho,
macio e morno. Arrumou as cobertas e admirou a filha, tão linda quanto as tias. Ela a ensinaria a
desfrutar de sua beleza, mas não viver em função dela. Deixou a filha dormindo e silenciosamente seguiu
seu caminho pelo corredor, até o quarto maior. Ao entrar, parou e fechou os olhos por um instante,
inspirando profundamente o cheiro de colônia misturado ao seu perfume. Era uma noite quente, e
ela ficou encantada ao ver as cortinas balançando com a brisa.
Ela tirou as roupas e foi
calmamente até a cama. Ele estava acordado, e sem dar nenhuma
palavra, pegou-a nos braços e a
puxou para seu calor. Ela se aninhou novamente a ele e sentiu a rigidez de seu corpo.
Lore Zingiretanko
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